Uma questão de escolha?
"Todo o individuo tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal". É assim que se encontra enunciado o artigo 3.º na Declaração Universal dos Direitos Humanos e sobre o qual eu gostaria de recair a minha atenção hoje.
O direito à vida tornou-se tão empírico no nosso quotidiano que o tomamos por certo e rejeitamos tudo o que atente contra ele, seja esta ameaça direta ou indireta. Porém, a ciência avançou, bem como a própria forma de pensar dos seres humanos. O porquê de trazer este assunto a palco? Num outro dia normal, como parte da minha rotina, iniciei a leitura de um livro: "Eu depois de ti". Parecia-me apenas mais um romance quando iniciei a sua leitura, até me deparar com uma temática que me despertou o interesse: morte voluntária. A personagem principal deste livro sofre um terrível acidente de atropelamento, o qual o deixa quadriplégico, ou seja, incapaz de se mover do pescoço para baixo. Este jovem, que vive atormentado pela vida que vivia e sem outra hipótese a não ser renegar-se à vida dependente dos outros que lhe espera, decide por término à sua vida através de morte assistida. No livro é referida a clínica Dignitas, que se localiza na Suíça, como o local escolhido pelo personagem para por término à sua vida. "DIGNITAS - To live with dignity - to die with dignity" foi fundada em 1998, em Forch. É uma organização que defende que os pacientes que se encontrem em condições terminais ou em estados de dor severa e permanente, devem ter direito de escolha quanto à sua última escolha. Segundo a brochura que esta clínica apresenta, é administrado aos seus pacientes normalmente uma dose de cerca de 15g de pentobarbital na sua forma sódica num copo de água, que leva a que estes adormeçam e depois faleçam sem qualquer dor quando se encontram já inconscientes.
Pentobarbital é um barbitúrico que tem atividade sedativa, hipnótica e antiespasmódica, mas que em doses elevadas pode tornar-se tóxico. Esta clínica também assegura que todos os pacientes passam por um processo de seriação, o qual segue critérios como a avaliação da saúde mental do paciente para que seja assegurada a voluntariedade do doente em relação a esta decisão. Mas será que é eticamente correto tal opção? Já há muito que somos confrontados com esta polémica acerca se é correto ou não por um término voluntário à vida.
O termo eutanásia não é nosso desconhecido e, por definição, a eutanásia é quando, por exemplo, um médico injeta uma dose letal de um medicamento num doente e este morre. Porém, a definição de morte assistida é ligeiramente diferente. Morte assistida é quando uma pessoa ajuda outra a matar-se a si própria, como por exemplo, ligar uma pessoa a uma maquina de inalação que só emite dióxido de carbono e dizer-lhe como é que esta se liga, mas não a ligando, ou seja, acabamos por dar todos os meios à pessoa para se suicidar deixando que seja esta a escolher. A questão que se coloca maioritariamente é: "Não estamos a cometer um homicídio na mesma? Não é o mesmo que estarmos a matar a pessoa?" Bem, há quem diga que sim e que esta não deveria ser legalizada, mas também há quem diga que não, que é uma escolha e que todos nós temos direito à liberdade de escolha, tal como é enunciado na Declaração Universal dos Direitos Humanos.
Associada a esta polémica, tem surgido há já alguns anos inúmeras noticias de casos onde esta opção foi tomada e levada a termo como foi o caso de Daniel James, um jovem de 23 anos que ficou paralisado do peito para baixo num acidente durante um jogo de Rugby, ou de um casal britânico, ambos em estado terminal, que decidiu por término à sua vida em conjunto em 2009. Há quem diga que escolher a morte assistida é o caminho mais fácil a tomar e que existem inúmeras outras soluções para doentes que se encontram em estados terminais. E isto não é de todo mentira. Contudo, aqueles doentes que estão presos a uma máquina de ventilação, sem quaisquer perspetivas de melhorar, quando esta lhes é desligada por ordens suas, também não acaba por ser morte voluntária? Ou então quando assinam papéis para não serem reanimados em caso de paragem cardíaca? Acho que toda a polémica que existe em torno destas decisões existe por um simples motivo: a morte assusta-nos. E assusta-nos por um simples razão: adoramos viver e adoramos a vida. E só o pequeno pensamento de que alguém possa estar disposto a por término à sua vida de forma voluntária revolta-nos, mas não porque estamos contra, mas sim porque não conseguimos perceber a posição daquela pessoa.
Quanto a Will, personagem do livro, deixo-vos a curiosidade de saberem ou não se este foi a cabo com a sua decisão e o porquê. As decisões quanto ao término da vida serão sempre uma polémica que, muito honestamente, nunca vai ser aprovada por consenso entre a população, e que acho que só podemos verdadeiramente dizer se concordamos ou não com ela quando (e esperemos que não seja o caso) nos deparamos numa destas situações, onde a vida já não é uma bênção, mas começa sim a parecer um fardo.
Mas a vida é feita de escolhas e no final do dia esta acaba por ser mais uma.
Texto: Diana Guedes
Créditos imagem: Hans Braxmeier